Governo recruta gestores no privado
Ao que o Expresso apurou. pelo menos desde o final de agosto, a Heidrick & Struggles e a Boyden entrevistaram pessoas, sobretudo com carreira no sector privado e sem ligações ao funcionalismo público. Nas conversas, os elementos das empresas deixaram perceber que especificidades adquiridas no sector privado seriam particularmente valorizadas na apreciação. Este perfil contrasta com o currículo dos anteriores gestores dos PO temáticos, escolhidos entre altos quadros do funcionalismo público (embora possam também ter passado pelo privado).
As empresas encarregadas do recrutamento “valorizaram muito uma valência de gestão financeira”, disse ao Expresso José Santos Soeiro, o presidente da Agência para o Desenvolvimento e Coesão (ADC), criada pelo Governo para coordenar as políticas cofinanciadas pelos fundos europeus - e entidade que contratou diretamente a Heidrick & Struggles e a Boyden. A primeira pertence ao grupo Ongoing. A segunda é a multinacional de recursos humanos para a qual entrou em março o ex-presidente da Cãmara do Porto Rui Rio.
O Executivo esclarece que foram entrevistados quadros do privado e da Administração Pública. Castro Almeida defende o novo modus operandi: “É preciso ter gente de altíssima qualidade. São eles que vão decidir sobre milhares de milhões de euros. Quisemos procurar os melhores, mesmo gente que está bem e com emprego. E para isso estamos a fazer uma aproximação aos métodos seguidos pelas empresas privadas, que contratam as head-hunters que lhes podem indicar os quadros com o melhor perfil”.
“Profissionalizar a escolha”
Para o secretário de Estado, “até agora o método tradicional de seleção tem sido a livre escolha. Ora, nós quisemos profissionalizar essa escolha”. Trata-se de “um passo em frente” e de “uma mudança virtuosa”, afirma. E de certa forma antecipando-se à critica, deixa cair que “tudo o que é inovador causa perturbação e descontentamentos”.
Nunes Correia, ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional do Governo de José Scrates - e responsável no Executivo pela coordenação da aplicação do anterior quadro comunitário (2007-2013) -, diz que esta prática demonstra a “hostilidade e a falta de respeito do atual Governo com tudo o que cheire a Administração Pública”. O ex-ministro diz que, no passado, “tendo em conta a natureza da tarefa, o conhecimentos dos fundos comunitários e da máquina do Estado era um requisito fundamental na escolha do gestor”. A identificação dos candidatos era feita a partir dos ministérios e nos organismos do Estado, nunca tendo havido o recurso a qualquer entidade externa para fazer o recrutamento, garante.
Segundo Fernando Neves de Almeida, managing partner da Boyden, o perfil dos entrevistados foi “definido” pela sua empresa, “com base no que irá ser a função das pessoas em questão”. A Heidrick & Struggles não deu qualquer resposta.
A totalidade dos chamados FEEI (fundos europeus estruturais e de investimento), sigla atual para os dinheiros oriundos de Bruxelas e destinados a Portugal até 2020, ascende a €25,6 mil milhões. Desse bolo, os PO temáticos, os confiados a gestores em processo de recrutamento, são uma camada significativa (quase €12 mil milhões), dividida em quatro fatias: PO competitividade e internacionalização, €4,4 mil milhões; PO inclusão social e emprego, €2,1 mil milhões; PO capital humano, €3,095 mil milhões; e PO eficiência de recursos e sustentabilidade, €2,2 mil milhões). Cada PO terá uma comissão diretiva, chefiada por um presidente ou gestor.
Cada empresa, segundo o presidente da ADC, entregou cinco perfis para cada gestor (20 pessoas no total). Entre as listas da Boyden e da Heidrick & Struggles (cujo trabalho custará cerca de €100 mil) há nomes repetidos, revela José Santos Soeiro. E entre eles, “há pessoas que exercem ou já exerceram no passado este tipo de funções”, acrescenta.
A palavra final será do Governo. O objetivo é “escolher as pessoas e submeter os seus nomes à CRESAP [a comissão que dá parecer sobre a nomeação de gestores públicos] até ao final de outubro”, diz o secretário de Estado. “E ficaríamos muito confortados se vierem a ser escolhidas pessoas da Administração Pública que já estão a gerir fundos”, admite.
https://www.boyden.pt/portugal/pt/media/8886/governo_recruta_gestores/index.html
Nesse caso, com alguma ironia, “os melhores”, os que vão gerir €11.892.685.407, estariam já dentro de casa.
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